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segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Etnias Indígenas Brasileiras

Estamos postando um relatório, enviado pelo Pr. Kenneth Eagleton, da Igreja Batista Livre de Campinas, que trata da situação da evangelização dos índios de nosso País. Paz!


ETNIAS INDÍGENAS BRASILEIRAS:

RELATÓRIO 2010

ORGANIZADOR: Ronaldo Lidório

O universo indígena brasileiro, diversificado e multicultural, tem sido constante alvo de dimensionamento estatístico e sociocultural. Neste documento apresentarei o relatório da Coordenação de Pesquisa do Departamento de Assuntos Indígenas (DAI) da Associação de Missões Transculturais Brasileiras (AMTB), que possui 41 agências missionárias filiadas as quais abrigam missionários vinculados a mais de 120 diferentes denominações evangélicas.

O presente relatório é fruto da análise do Banco de Dados do DAI e conclusões no que se refere às tendências demográficas, composição étnica e iniciativas evangélicas entre os povos indígenas em diversas áreas. Observaremos as 37 etnias indígenas vivendo em risco de extinção, as 41 emergentes e o processo de urbanização em 111 diferentes grupos. Veremos as 121 etnias pouco ou não evangelizadas, as 95 sem presença missionária e as 38 línguas com clara necessidade de tradução bíblica ou projeto especial de oralidade. Seremos também informados sobre os 257 programas e projetos sociais coordenados pela força missionária evangélica junto aos povos indígenas e sua expressiva relevância.

A Coordenação de Pesquisa concluiu em 2010 uma ampla pesquisa e revisão de dados juntamente com seus parceiros: Conselho Nacional de Pastores e Líderes Evangélicos Indígenas (CONPLEI), ETHNOLOGUE/SIL, PNA100, SEPAL, Instituto Antropos, diversos pesquisadores de campo e colaboradores de análise. As pesquisas étnicas têm caminhado de forma frutífera no movimento missionário evangélico brasileiro. Carl Harrison, Rinaldo de Mattos, Isaac Souza, Ana Bacon, Osvaldo Álvares, Ted Limpic, Enoque Faria e Paulo Bottrel, entre outros, desenvolveram com competência ao longo dos anos esta pesquisa, organização e análise de dados, cujo resultado é o Banco de Dados do Departamento de Assuntos Indígenas da AMTB.

Nesta presente revisão (DAI/AMTB 2010) foram feitas 27 pesquisas de campo, 76 entrevistas, consultados os bancos de dados do IBGE, FUNASA e FUNAI, entre outros, com um total de 4.200 dados avaliados. Um grupo de trabalho foi formado para a revisão do Banco de Dados: Edson Bakairi, Stan Anonby, Wilsamara Filgueiras, Andreas Fuchs, Richard Eger e Ronaldo Lidório . Vários irmãos colaboraram de maneira preciosa ao longo da revisão, aos quais somos imensamente gratos. Agradecemos de forma especial também a Elisabete Wiens, Cassiano Luz, Adriano Hedler, David Philips, Marcelo Carvalho e Gedeon Lidório que investiram tempo e esforço nesta tarefa. Os diretores do DAI/AMTB, Rocindes Correia e Edward Luz, coordenaram o andamento do trabalho e o processo de conclusão das análises.

Os resultados apresentam um quadro eclético, que envolve crescente migração urbana, uma explosão de indivíduos que passam a se autodeclarar indígenas nos últimos 15 anos, acelerada perda da língua materna nas etnias periféricas às áreas urbanas e intensificação dos problemas de saúde, educação e subsistência nos ambientes de aldeamento.

O demonstrativo estatístico quanto à presença evangélica e missionária também nos apresenta dados que informam e nos fazem refletir. A Igreja indígena está em franco crescimento, e isto se dá a partir das relações inter-tribais locais, atuação missionária com ênfase no discipulado e treinamento indígena e três fortes movimentos indígenas nacionais. A presença missionária coordena mais de duas centenas de programas e projetos sociais de relevância que minimizam o sofrimento em áreas críticas, sobretudo em educação e saúde, e valorizam a sociedade indígena local. O registro linguístico, associado a produção de material para letramento, é outro vigoroso fruto das iniciativas missionárias que se envolvem, especialmente, com grupos à margem do cuidado e interesse da sociedade.

A seguir serão apresentados os dados e algumas implicações associadas aos mesmos. Na segunda parte deste relatório será fornecido o demonstrativo estatístico com um resumo dos dados e visualização de gráficos.

TENDÊNCIAS DEMOGRÁFICAS

O crescimento da população geral dos povos indígenas no Brasil é muito significativo. Em 1991 a população indígena oficial do Brasil era formada por 294.000 indivíduos. A partir do ano 2000, porém, o IBGE passa a registrar aumentos de até 150% de indivíduos que se autodeclaram indígenas, principalmente nas áreas urbanas ou em urbanização. 734.000 pessoas se declararam indígenas na pesquisa do IBGE do ano 2.000 perfazendo um total de quase 900.000 em 2010. Há diversos motivos para tal crescimento estatístico. Observa-se que tal fenômeno de autodeclaração em grande escala ocorreu principalmente nas regiões urbanas e em urbanização do Nordeste e Sudeste. Os motivos são os mais diversos, mas avaliamos que três sejam principais: reavivamento cultural , movimentação política ou busca pelos incentivos governamentais.



A Fundação Nacional da Saúde (FUNASA), órgão vinculado ao Ministério da Saúde, apresentou relatórios recentes onde 520.000 indigenas estão sendo atualmente atendidos em 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI’s) vinculados ao Sistema Único de Saúde (SUS). 54.2% dessa população localiza-se na Amazônia legal e 26% em estados da Região Nordeste.

O DAI/AMTB, analisando as etnias conhecidas e em estudo, reconhece a população de 616.000 indígenas em 2010. Dentre estes, 52% habitam em aldeamentos e 48% em regiões urbanizadas ou em urbanização. Cerca de 60% da população indígena brasileira habita a Amazônia Legal, composta pelos estados do Amazonas, Acre, Amapá, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins, Mato Grosso e parte do Maranhão. A partir das leituras de movimentos demográficos, porém, em 5 anos haverá igualdade entre aqueles que habitam as aldeias e os que habitam as pequenas e grandes cidades. A partir de 2015 a quantidade de indígenas habitando centros urbanos será certamente maior, e em gradual aumento.

Há uma marcante presença de etnias minoritárias no quadro geral. 35 etnias são formadas por até 100 pessoas; 85 entre 101 e 500 pessoas; 31 entre 501 e 1.000 pessoas; 56 entre 1.001 e 5.000 pessoas; 10 entre 5.001 e 10.000 pessoas; 7 entre 10.001 e 20.000; e 4 formadas por população acima de 20.000 pessoas. 76 etnias não possuem situação populacional determinada e 36 partilham sua população com países limítrofes.

Segundo a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) há 611 Terras Indígenas (TIs) reconhecidas ou em fase de reconhecimento que correspondem a 13% das terras do país, sendo 21% da Amazônia legal.

COMPOSIÇÃO ÉTNICA

A percepção do dimensionamento étnico passa por diversos filtros que nublam uma estatística mais segura. Um destes filtros é a existência dos grupos ainda isolados, ou seja, etnias que habitam em áreas remotas e que possuem pouco ou nenhum contato com os demais segmentos indígenas ou não indígenas. Há 37 grupos listados nesta categoria, mas eles podem chegar a 52.

Há também várias etnias tratadas de forma unitária, que de fato são grupos com distintas identidades socioculturais e lingüísticas. Um exemplo seriam os Yanomami, frequentemente listados como um grupo indígena, mas que compõem diversas etnias distintas. O mesmo ocorre com os chamados “Maku”, um termo genérico e pejorativo, utilizado para se referir a pelo menos 5 diferentes etnias.

Por fim, há também os grupos ressurgidos (ou emergentes) que, pela miscigenação com não-indígenas (e outros fatores de dispersão), perderam por algum tempo sua auto-identificação étnica. Por diversos motivos vários voltaram a solicitar seu reconhecimento como povos indígenas e formam 41 etnias em todo o território nacional. Se incluirmos nesta categoria aqueles
que, mesmo não tendo perdido a sua auto-identificação por um período, experimentaram um intenso e crescente envolvimento com a sociedade externa (também chamados de “aculturados” em alguns meios) teremos o total de 94 grupos.

Desta forma, entre as etnias conhecidas (228), as isoladas (27), as parcialmente isoladas (10), as possivelmente extintas (9), as ressurgidas (41) e as ainda a pesquisar (25), reconhecemos um quadro formado por 340 grupos.

É importante destacar que 37 destas etnias vivem com risco de extinção, levando em consideração sua população (inferior a 35 pessoas), elementos socioambientais desfavoráveis, limitado acesso a assistência de saúde, conflitos e dispersão, que são os 5 principais fatores no processo de extinção de um grupo.

Um dado relevante refere-se ao crescente processo de urbanização. 111

etnias possuem representação em pequenas e grandes cidades, e declaram que os elementos de atração são (1) busca por educação formal em Português; (2) proximidade de uma melhor assistência à saúde; (3) acesso a produtos assimilados (especialmente roupas, alimentos, entretenimento e álcool); e (4) expectativa de melhor subsistência. Os dados quanto ao processo de urbanização e suas implicações socioculturais, sociolinguísticas e familiares ainda são inconclusivos, porém, apontam, em grande parte, para um cenário por demais preocupante, formado por sérias deficiências de inclusão social; empobrecimento da dieta alimentar e dificuldade de acesso às iniciativas de assistência pública.

INICIATIVAS EVANGÉLICAS

A Igreja Indígena está presente, em diferentes níveis de representação, em 150 etnias, possuindo igreja local com liderança própria em 51 e sem liderança própria em 99.

Há presença missionária evangélica em 182 etnias indígenas. Esta presença representa mais de 30 Agências Missionárias Evangélicas e quase 100 diferentes Denominações.

Em 165 destas etnias há programas e projetos sociais coordenados por missionários evangélicos. Destas, 92 possuem um programa social ativo, 54 possuem dois programas sociais ativos, e 19 possuem 3 ou mais programas perfazendo 257 programas e projetos com ênfase nas áreas de educação (análise linguística, registro, letramento, publicações locais e tradução), saúde (assistência básica, primeiros socorros e clínicas médicas), subsistência e sociocultural (valorização cultural, promoção da cidadania, mercado justo e inclusão social). Apenas 17 etnias com presença missionária evangélica não possuem um programa social ativo. Mais de 90% de todos os programas e projetos são subsidiados por igrejas, empresas e representantes evangélicos do Brasil. Estes números demonstram que a presença missionária evangélica está, histórica e tradicionalmente, sempre associada a iniciativas sociais e culturais, especialmente àquelas com forte valor para o povo local.

Dentre as 182 etnias com presença missionária evangélica, 132 possuem indígenas evangélicos e 50 não possuem. Há 16 seminários e cursos bíblicos no Brasil com ênfase no preparo indígena e 3 movimentos nacionais de iniciativa e coordenação indígena evangélica: o Conselho Nacional de Pastores e Líderes Evangélicos Indígenas (CONPLEI); a Associação de Mulheres Evangélicas Indígenas (AMEI) e a Associação Indígena de Tradudores Evangélicos (AITE).

Outro movimento nacional com ênfase nos direitos humanos e especial combate ao infanticídio foi iniciado pela ATINI – VOZ PELA VIDA, e aglutinou nos últimos anos apoio e participação de todos os segmentos evangélicos despertando o debate, expondo fatos contundentes e resultando
em ações de valorização à vida e apoio a crianças em risco de infanticídio.

Há 121 etnias pouco ou não evangelizadas, ou seja, aquelas em que não há presença missionária evangélica nem mesmo presença da igreja indígena. Outros fatores como acesso a outras etnias evangelizadas e dispersão demográfica também foram considerados nesta categoria. Destas 121 etnias pouco ou não evangelizadas, 74 habitam áreas viáveis. O restante se divide entre áreas parcialmente restritas (13) ou restritas (34).

Não há presença missionária em 95 etnias conhecidas, 27 etnias isoladas e 25 a pesquisar, totalizando 147 etnias sem presença missionária.

Dentre as 150 etnias com presença evangélica indígena, 99 não possuem liderança própria e 54 não dispõe de acesso a nenhum programa de ensino bíblico, o que demonstra que a Igreja indígena está em franco crescimento, porém não há proporcional desenvolvimento do ensino e treinamento, o que pode gerar graves problemas como sincretismo e nominalismo.

ANÁLISE LINGUÍSTICA E TRADUÇÃO DA BÍBLIA

Consideramos a existência de 181 línguas indígenas no Brasil, apesar das diferentes discussões e estudos ainda inconclusivos sobre várias delas.

Em 54 línguas há programas de análise linguística e letramento em andamento, sob iniciativa evangélica. Em 31 destas línguas há também programas de tradução bíblica em andamento. No momento contamos com 58 línguas que possuem porções bíblicas, o Novo Testamento ou a Bíblia
completa em seu próprio idioma, material este que serve a 66 etnias.

Em 3 línguas há a Bíblia completa (que serve a 7 etnias); em 32 há o Novo Testamento completo (que serve a 36 etnias) e em 23 há porções bíblicas, que servem ao mesmo número de etnias.

Há 10 línguas com clara necessidade de tradução bíblica, 28 com necessidade de um projeto especial de tradução com base na oralidade e 31 com situação ainda indefinida, a avaliar. Estas 31 línguas a avaliar são faladas por 59 etnias. Tanto as línguas com necessidade de projetos de tradução quanto aquelas com necessidade de um projeto especial de oralidade possuem pouquíssima possibilidade de compreensão do Evangelho em alguma outra língua, por outros meios de comunicação ou outros grupos próximos.

Há cerca de 132 etnias indígenas que falam o Português. 66 destas etnias falam somente o Português e 66 são bilíngues ou trilíngues com o Português. 48 destas 132 etnias manifestam a necessidade de uma nova versão da Bíblia em Português, que facilite o seu entendimento. Este assunto estará sendo alvo de maiores pesquisas e se avalia a possibilidade de desenvolvimento de um material oral para esta finalidade.

Segundo Moore, dentre as línguas vivas indígenas brasileiras 13% possui descrição completa, 38% possui descrição avançada, 29% possui descrição incipiente e 19% possui pouca ou nenhuma descrição. 1% em situação indefinida.

O pesquisador alemão Michael Kraus afirma que 27% das línguas sul-americanas não são mais aprendidas pelas crianças. Isso significa que um número cada vez maior de crianças indígenas perde o poder de comunicação em uma língua indígena a cada dia. As razões vão desde a imposição socioeconômica nas etnias mais próximas dos vilarejos e povoados até a falta de valorização sociocultural do grupo, o que fortalece os fatores de atração em direção à sociedade envolvente.

Estima-se que, na época da conquista pelos portugueses, eram faladas 1.273 línguas. Ou seja, perdemos 85% de nossa diversidade lingüística em 500 anos. Estudiosos afirmam que há uma crise sociolingüística no estado de Rondônia, onde 65% das línguas estão seriamente em perigo por não serem mais usadas pelas crianças e por terem pequeno número de falantes.

A perda lingüística está associada a perdas culturais irreparáveis, como a transmissão do conhecimento, formas artísticas, tradições orais, perspectivas ontológicas e cosmológicas.

A presença de linguístas, educadores e tradutores missionários, através de iniciativas ligadas a AITE (Associação Indígena de Tradutores Evangélicos), ALEM (Associação Lingüística Evangélica Missionária), AMEM (A Missão de Evangelização Mundial), Amanajé, APMT (Agência
Presbiteriana de Missões Transculturais), ATE (Associação Transcultrural Evangélica), JAMI (Junta Administrativa de Missões) da Convenção Batista Nacional, JOCUM (Jovens com Uma Missão), JMN (Junta de Missões Nacionais) da Convenção Batista Brasileira, MEIB (Missão Evangélica aos Índios do Brasil), MICEB (Missão Cristã Evangélica do Brasil), Missão Evangélica Caiuá, Missão Indígena UNIEDAS, MEVA (Missão Evangélica da Amazônia), MNTB (Missão Novas Tribos do Brasil), SIL (Sociedade Internacional de Lingüística), entre várias outras, catalogando, analisando e produzindo material de letramento nas línguas indígenas, colabora para a valorização lingüística, social e cultural da população indígena como um todo.

Assim, entende-se que o evangelho não apenas responde aos questionamentos da alma humana, como também contribui para a sobrevivência individual, social, cultural e lingüística dos povos indígenas no Brasil.


DESAFIOS REPRESENTADOS

Perante tal quadro vários desafios se apresentam, e destacarei os que estão ligados à (1) pesquisa e avaliação, (2) evangelização e discipulado, (3) tradução e uso das Escrituras bíblicas, (4) treinamento indígena, (5) necessidade de novos missionários, (6) necessidade de apoio aos projetos já em andamento e (7) apoio especializado.

De pesquisa e avaliação
O objetivo é dimensionar a realidade étnica, linguística e sociocultural e colaborar na elaboração de novas iniciativas de relevância junto aos povos idígenas do Brasil.

As 42 etnias remotas e as 37 etnias com risco ou já em processo de extinção demandam atenção.

As 121 etnias pouco ou não evangelizadas demandam pesquisa para avaliação de estratégias adequadas de cooperação e interação com tais povos.

Ampla pesquisa necessita também ser realizada entre as 111 etnias em processo de urbanização, os fatores de atração e as implicações para tais grupos.

As 59 etnias que falam línguas ainda a serem avaliadas demandam pesquisa sociolinguística.

É necessário também avaliar a demanda de 48 etnias que são monolíngues, bilíngues ou trilíngues do Português e expressam a necessidade de uma versão mais compreensível da Bíblia no próprio Português.

De evangelização e discipulado

Das 121 etnias pouco ou não evangelizadas, 79 habitam áreas chamadas viáveis, ou seja, em que é possível uma interação com os povos indígenas sem maiores barreiras. Outras 47 habitam áreas restritas ou parcialmente restritas. Chama a nossa atenção o alto número de etnias sem conhecimento do evangelho em áreas relativamente abertas e sem iniciativas evangélicas e missionárias.

Há ainda 95 etnias indígenas conhecidas sem presença missionária, o que manifesta que a grande necessidade dos movimentos missionários ainda são os recursos humanos. Pensando que mais de 40% das ações missionárias em andamento demandam com urgência mais pessoas para assegurar o seu prosseguimento, e que 95 etnias permanecem sem presença missionária, podemos estimar a necessidade de no mínimo 357 novos misssionários para reforçar o trabalho existente e iniciar os novos. Levando em consideração as ações especializadas bem como o trabalho administrativo, logístico e pastoral que tanto precedem quanto acompanham tais iniciativas, asseguradamente seriam necessários um total de 500 novos missionários para fazer frente ao presente desafio total. Isto não será possível sem (1) a mobilização da Igreja brasileira no recrutamento e envio, (2) o apoio às organizações missionárias, (3) o apoio às instituições de ensino e preparo missionário, teológico, missiológico, antropológico e linguístico, e (4) muita oração.

As 37 etnias com confirmado ou possível risco de extinção bem como as 111 em processo de urbanização formam dois grupos com movimentos demográficos distintos, mas igualmente carentes de evangelização e discipulado.

De tradução e uso das Escrituras

O desafio nesta área se faz presente tanto nas 10 línguas com carência confirmada de tradução bíblica, nas 28 com necessidade de um projeto especial de oralidade, como também nas 54 que possuem projetos linguísticos e de tradução em andamento. É imperativo apoiarmos aqueles que já estão no caminho, com longo trabalho já realizado, e não somente investirmos em novas iniciativas.

Há também um desafio apresentado em muitas etnias que já possuem a Bíblia, ou porções bíblicas, em sua língua materna, e se refere ao uso das Escrituras. Há 17 etnias com acesso à Bíblia (seja porção, Novo Testamento ou Velho Testamento) na língua materna, mas sem indígenas evangélicos entre eles. Ou seja, a Bíblia está presente, mas não está sendo usada. Há ainda outras 25 etnias com o mesmo acesso à Bíblia, e com existência da igreja indígena local, mas sem liderança própria.

Vemos, portanto, que nesta área precisamos olhar para os que já estão caminhando, para que não parem ao longo do caminho; para os que irão iniciar a caminhada com novos desafios, e para aqueles cujo trabalho de tradução já foi concluído, mas o uso das Escrituras necessita ser reavivado. Precisamos de educadores e mestres na mesma proporção que linguistas e tradutores.

De treinamento indígena

As 99 etnias com igreja evangélica, mas sem liderança própria, representam a extensão do desafio de treinamento em nossos dias. Junta-se a isto o fato de que 67 destas etnias possuem pouco acesso a cursos bíblicos, e 54 não possuem nenhum acesso.

A Igreja Indígena vive um momento de crescente interesse na capacitação bíblica e em outras diversas áreas, porém sofre com a ausência de treinamento perante a demanda e necessidade. É necessário observarmos para onde o vento sopra e nos juntarmos a este movimento. Entre os anos de 2006 e 2007 há registro de 1.690 indígenas que participaram de encontros e congressos do CONPLEI ou apoiados pelo CONPLEI. Em 2008 e 2009 este número subiu para 2.350, demonstrando o grande interesse pela comunhão inter-étnica, treinamento e capacitação.

Há, portanto, necessidade de fortalecer os seminários e cursos já implementados para o treinamento indígena, investir em novas iniciativas como a Capacitação Bíblica Missionária Indígena (CBMI) e também encorajar os movimentos de treinamento de própria iniciativa indígena, como o CONPLEI.
Uma das conclusões estratégicas mais claras e urgentes nestes últimos anos é esta: é necessário investir de forma intencional e abundante no treinamento dos líderes indígenas evangélicos.

De novos missionários e iniciativas

Como foi mencionado há grande necessidade de no mínimo 500 novos missionários nos próximos anos para fazer frente às demandas e oportunidades. É de senso comum que eles (1) tenham compromisso com Cristo e a obra missionária entre os povos indígenas; (2) estejam desejosos de se envolverem com desafios e programas de médio e longo prazo; (3) sejam aptos ao aprendizado de uma nova língua e cultura; (4) tenham forte desejo de se envolverem com o universo indígena de forma integral; (5) sejam aprovados segundo a Palavra de Deus (1 Timóteo 3).

Há necessidade de novos missionários tanto para a condução de projetos mais antigos, em andamento, como em novas iniciativas. Em ambas as situações as principais atividades são: (1) Evangelização e plantio de igrejas; (2) Discipulado e treinamento de líderes indígenas; (3) Desenvolvimento de ações sociais relevantes; (4) Tradução bíblica e projetos especiais de oralidade; (5) Apoio especializado: logística, transporte e comunicação; missiologia, linguística e antropologia; (6) Pesquisa e desenvolvimento de estratégias.

De apoio a projetos em andamento

É necessário atenção às atividades missionárias em andamento, especialmente aquelas que estão em fase de consolidação ou conclusão (mais de 10 anos). Pela índole da Igreja Evangélica Brasileira, e seu afã por novas iniciativas, não raramente deixamos para trás preciosas sementes que foram lançadas na terra há uma ou mais décadas e que precisam de maior atenção e apoio. Refiro-me, portanto, à presença missionária em 182 etnias, aos 257 programas sociais em atividade, aos projetos de linguística e tradução em 54 línguas, aos três grandes movimentos evangélicos indígenas e aos 16 seminários e cursos com ênfase no treinamento indígena. Há clara
necessidade de apoio para a consolidação e continuidade de tais atividades.

De apoio especializado

Em diversas atividades missionárias há necessidade de apoio técnico especializado, essencial para a qualidade da produção. Podemos citar áreas como a linguística, antropologia, missiologia, pesquisa, desenvolvimento comunitário, ações sociais, consultoria jurídica, transporte, comunicação e logística. Sem um adequado fortalecimento no apoio especializado as ações missionárias entre os povos indígenas perderão força, qualidade e oportunidade.

Podemos observar instituições e iniciativas como Asas do Socorro e sua atuação no apoio logístico, transporte, comunicação e ações sociais. Tais iniciativas, especializadas, multiplicam as ações missionárias, melhoram a qualidade do serviço e são parte fundamental para o trabalho realizado.


CONCLUSÃO

O sincero desejo de se relacionar de forma relevante com os povos


indígenas não é suficiente para assegurar posturas, abordagens e iniciativas acertadas. Faz-se necessário um relacionamento dialógico, constante auto-avaliação e discernimento.

A AMTB, em seu código de valores, expresso na introdução do livro A Questão Indígena, Editora Ultimato, afirma que o movimento missionário evangélico possui alvos de forte colaboração com a preservação cultural, social e lingüística das sociedades indígenas de nosso país, tais como:

– Contribuir para que o indígena valorize e permaneça em sua própria terra natal (sua ‘homeland’) evitando migrações tempestivas e com conseqüência social negativa para as beiras dos grandes rios, centros em urbanização ou urbanizados.

– Colaborar para que haja um bom programa de educação na própria língua materna, valorizando-a e possibilitando que seus fatos históricos e sociais sejam por eles registrados, preservados e transmitidos perante este contexto de rápida influência social externa que não raramente invalida o valor da língua materna para um grupo.

– Colaborar para que haja programas em áreas vitais, como a saúde, que responda às necessidades essenciais dos grupos indígenas.

– Contribuir para que, em processos já em andamento de integração com a sociedade não indígena, se colabore com os mecanismos de valorização étnica, cultural e lingüística, a fim de que o grupo não seja diluído perante a sociedade maior. Também colaborar com o grupo em sua busca por uma convivência digna com outros, quando fora da sua terra natal.

Mais adiante expõe sua crença no evangelho que liberta e, como tal, seu desejo de partilhá-lo com todos os povos. Para tal, distingue a evangelização da catequese dizendo: Esta evangelização difere-se da catequese em relação ao conteúdo, abordagem e comunicação. O conteúdo da catequese é a Igreja, com seus símbolos, estrutura e práticas, sua eclesiologia. O conteúdo da evangelização é o evangelho, os valores cristãos centrados em Jesus Cristo. A abordagem da catequese é impositiva e coercitiva. A abordagem da evangelização é dialógica e expositiva. A catequese se comunica a partir dos códigos do transmissor, sua língua e seus costumes, importando e enraizando valores. A evangelização se dá com a utilização dos códigos do receptor, sua língua, cultura e ambiente, respeitando os valores locais e contextualizando a mensagem.

Cremos, portanto, que a experiência transformadora de João Batista é plano de Deus para todo o mundo: “No dia seguinte João viu a Jesus, que vinha para ele, e disse: Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo”. (Jo 1: 29)

Referência

IBGE, 2005. Tendências demográficas: uma análise dos indígenas com base nos resultados da amostra dos censos demográficos 1991 e 2000. Rio de Janeiro: IBGE.

FUNASA, 2009. Sistema de Informação da Atenção à Saúde Indígena – Siasi – Demografia dos Povos Indígenas. Quantitativos de pessoas. Consulta online: www.funasa.gov.br

KRAUSS, M. The world’s languages in crisis. Language, n. 68, 1992.

LEWIS, Paul, editor. Ethnologue: Languages of the World. 16th edition. Dallas, Tex.: SIL International. Online version: www.ethnologue.com

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PAGLIARO, Heloísa (org.), Demografia dos Povos Indígenas no Brasil, Rio de Janeiro, Editora Fiocruz e Associação Brasileira de Estudos Populacionais, 2005.

RICARDO, C. A. & Ricardo, Fany. Povos indígenas no Brasil 2000/2006. São Paulo: Instituto Socioambiental, 2006.

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SOUZA, Isaac Costa de & Lidório, Ronaldo (Org). A questão indígena: Uma luta desigual. Viçosa: Ultimato, 2008